Poucas frases ditas por Jesus causam tanto impacto imediato quanto essa: “Deixa que os mortos enterrem seus mortos”. Registrada em Lucas 9:60, ela aparece no momento em que alguém deseja segui-lo, mas pede para primeiro sepultar seu pai. A resposta de Cristo, embora aparentemente dura, carrega um ensinamento profundo e urgente sobre prioridades espirituais:

“Jesus, porém, lhe respondeu: Deixa aos mortos o enterrar os seus mortos; porém tu vai e anuncia o reino de Deus.”
(Lucas 9:60 – Almeida Revista e Corrigida – ARC)
Com essa declaração, Jesus confronta uma das maiores tensões do coração humano: a escolha entre os compromissos terrenos e o chamado celestial. Não se trata de um desprezo à família, mas de um chamado à ação inadiável. Quando Ele diz “deixa que os mortos enterrem seus mortos”, está nos mostrando que há momentos em que o Reino de Deus exige decisão imediata, e isso pode significar abrir mão até mesmo do que é culturalmente ou emocionalmente prioritário.
O tom é direto, mas cheio de propósito: os mortos espiritualmente, ou seja, aqueles que vivem sem a direção de Deus, podem lidar com as questões deste mundo. Já os vivos em Cristo, os que foram chamados, devem ir e anunciar as boas novas sem hesitação.
Essa mensagem permanece atual. Em tempos em que muitos adiam decisões espirituais por questões familiares, emocionais ou sociais, o ensino de Jesus continua ecoando: há uma urgência em responder ao chamado de Deus. E essa urgência exige foco, coragem e fé.
Para aprofundar essa reflexão, ao final do artigo explicaremos como essa mensagem se relaciona com um trecho marcante do livro dos Salmos um salmo que reforça a importância de colocar a vida diante de Deus com seriedade e entrega.
Deixe que os mortos enterrem seus mortos
A expressão deixe que os mortos enterrem seus mortos contém um jogo de palavras com duplo sentido que só se revela com atenção ao contexto espiritual do ensinamento de Jesus. Essa frase, embora enraizada em uma situação prática, o sepultamento de um pai, vai além do literal para comunicar verdades espirituais profundas.
No primeiro plano, Jesus se refere aos mortos fisicamente: pessoas que de fato faleceram e precisam ser enterradas. No segundo plano, e mais importante, Ele fala dos mortos espiritualmente: aqueles que, embora vivos em corpo, estão afastados da vida que vem de Deus. São indivíduos que vivem segundo os valores do mundo, sem reconhecer a urgência do Reino dos Céus.
Essa figura de linguagem é comum no estilo de ensino de Jesus. Ele frequentemente utilizava metáforas impactantes para sacudir a mentalidade de seus ouvintes. Ao dizer “deixe que os mortos enterrem seus mortos”, Cristo está distinguindo os que vivem apenas para o agora daqueles que entenderam o chamado para algo eterno.
A metáfora mostra que há atividades legítimas neste mundo, como enterrar um ente querido, que, mesmo sendo honrosas, não podem tomar o lugar do chamado divino. Aqueles que ainda não despertaram para a realidade do Reino podem se ocupar com essas tarefas. Mas os que ouviram a voz de Cristo precisam se mover em obediência, colocando a missão de anunciar o Reino em primeiro lugar.
Essa distinção entre os dois tipos de mortos aparece em outros momentos das Escrituras, mostrando que viver longe de Deus é, em essência, viver em estado de morte espiritual. Já o verdadeiro viver está em seguir a voz do Mestre, mesmo quando isso exige deixar para trás aquilo que o mundo considera mais importante.
O que Jesus estava ensinando com essa frase?
Quando Jesus disse “deixa que os mortos enterrem seus mortos”, Ele estava comunicando uma verdade exigente, porém essencial: seguir a Cristo requer prioridade absoluta. Não há espaço para meio compromisso no discipulado cristão. A decisão de caminhar com Jesus implica, muitas vezes, abrir mão de convenções sociais, vínculos afetivos ou até mesmo tradições respeitáveis, tudo em favor de um propósito maior.
Essa declaração de Jesus se alinha diretamente com outro ensino firme registrado em Mateus 10:37 (ARC):
“Quem ama o pai ou a mãe mais do que a mim não é digno de mim; e quem ama o filho ou a filha mais do que a mim não é digno de mim.”
Aqui, Jesus não está mandando abandonar a família ou ignorar responsabilidades, mas está estabelecendo uma hierarquia de amor e lealdade. Ele está dizendo, com clareza, que nada nem ninguém pode ocupar o lugar d’Ele no coração do discípulo.
Do ponto de vista teológico, isso revela que o chamado ao discipulado é radical, total e sem reservas. É o convite para uma nova forma de viver, uma vida centrada em Deus e não mais nas expectativas do mundo ou nas tradições humanas. Jesus estava formando discípulos comprometidos, não simpatizantes ocasionais.
Na prática, isso significa que, muitas vezes, obedecer a Cristo exigirá coragem para romper com padrões familiares, abrir mão de planos pessoais e caminhar por um caminho que muitos não compreenderão. É nesse contexto que a expressão “deixa que os mortos enterrem seus mortos” ganha sentido: não se trata de insensibilidade, mas de urgência espiritual.
Cristo nos chama para algo que não pode ser adiado. Ele não apenas pede nossa atenção, Ele exige nossa entrega. E essa entrega se traduz em ação: ir, anunciar, viver a fé com prioridade e propósito.
Por que seguir Jesus exige prioridade?
A expressão “deixa que os mortos enterrem seus mortos” revela que o seguimento a Cristo não pode ser tratado como uma opção secundária ou adiada. Jesus deixa claro que seguir a Ele exige prioridade total, mesmo diante de compromissos legítimos e profundamente emocionais, como enterrar um pai.
Essa lição é reafirmada pelas palavras de Jesus em Mateus 6:33 (ARC):
“Buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.”
Colocar o Reino de Deus em primeiro lugar não significa desprezar os deveres terrenos, mas sim ordenar nossa vida segundo a perspectiva do alto. É uma mudança de foco: do imediato para o eterno, do terreno para o celestial.
Na cultura judaica, sepultar os pais era não apenas uma obrigação familiar, mas um ato sagrado. No entanto, Jesus não estava rejeitando essa prática, Ele estava mostrando que há algo ainda mais sagrado: obedecer prontamente ao chamado de Deus.
Essa passagem nos ensina que o discipulado verdadeiro muitas vezes colide com as expectativas sociais, os costumes familiares e até os sentimentos mais profundos. Jesus não exige apenas espaço em nossa agenda, Ele requer o primeiro lugar em nossas decisões.
É por isso que o ensino contido na frase “deixa que os mortos enterrem seus mortos” continua tão desafiador: ela confronta diretamente a ordem de prioridades com que conduzimos a vida. E nos convida, de forma clara, a colocar a missão do Reino acima de tudo.
Leia também o salmo 14.
Aplicações práticas para os dias de hoje
O ensino contido na expressão deixa que os mortos enterrem seus mortos continua profundamente relevante no mundo atual, onde a pressa, os compromissos e as obrigações se acumulam a cada dia. Em meio a tantos convites para priorizar o sucesso profissional, os relacionamentos sociais ou os interesses pessoais, a voz de Cristo ainda nos chama a reavaliar nossas prioridades com seriedade.
Em um tempo marcado por distrações constantes, é fácil justificar o adiamento de decisões espirituais. Muitos desejam seguir Jesus “quando tudo estiver mais calmo”, ou “depois que resolverem certos assuntos”. No entanto, essa frase de Cristo é um chamado direto à ação imediata. Ele está dizendo: o Reino de Deus não pode ser colocado em segundo plano.
Viver de acordo com esse ensinamento exige coragem. Significa, por exemplo, tomar decisões alinhadas com os valores do Evangelho mesmo que isso custe aprovação social. Significa também não adiar o compromisso com Deus esperando por um momento mais “conveniente”, que talvez nunca chegue.
É necessário reconhecer que, embora algumas tarefas sejam legítimas, elas não devem substituir aquilo que é eterno. Em outras palavras: há tempo para tudo, mas há momentos em que Deus espera de nós respostas imediatas. Respostas que demonstram fé, confiança e disposição para obedecer.
Por isso, este é um convite à reflexão:
O que tem ocupado o primeiro lugar em sua vida?
O que você tem deixado para “depois” quando se trata do seu chamado espiritual?
Será que você não está esperando demais para dizer “sim” a Jesus?
Seguir a Cristo é uma decisão prática, diária e urgente. E como mostraremos ao final deste artigo, até mesmo o livro dos Salmos oferece uma perspectiva complementar a esse chamado radical de Jesus.